sexta-feira, outubro 28, 2011

A LER

"O sr. Presidente da República, entre a dissolução da Europa e uma viagem quase de circo ao Brasil e à Venezuela, resolveu criar um problema que o país não tinha ou de que, pelo menos, não se tinha lembrado: o da divisão de Portugal entre o partido do funcionalismo público e o partido dos trabalhadores privados."

SINAIS (28)

"Redução das deduções fiscais na saúde rende 440 milhões ao Estado - Medida pode ter efeitos perversos, alertam especialistas, que antecipam o regresso aos tempos em que era frequente nos consultórios perguntar-se: 'Quer recibo ou não quer recibo?' " - Público 

SINAIS (27)

"Consultora KPMG desmente ex-secretário de Estado Paulo Campos e é chamada à Assembleia da República" - título do Público

quinta-feira, outubro 27, 2011

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (8)

A perspectiva turca

TELEVISÃO DIGITAL TERRESTRE

Continua a campanha publicitária anunciando a introdução da televisão digital terrestre a partir do próximo ano. Retive a imagem de uma senhora toda sorridente e a frase "A partir de Janeiro se não tiver TDT não vê televisão". A frase é mais uma das de muito mau gosto com que os publicitários nacionais nos têm brindado. Da leitura de um dos anúncios respigo que o serviço começará a funcionar entre Janeiro e Abril de 2012 e que quem não tem TV paga "terá que mudar para a TDT para continuar a ver os seus programas favoritos". Ora, quem não tem TV paga, no caso de muitos agregados familiares com dificuldades, de desempregados e de reformados, é porque não pode, porque não tem meios para sustentar os canais do cabo. E se assim é, numa altura destas, em que o orçamento de milhões de portugueses está a ser amputado de uma parte substancial não faria sentido suspender ou retardar o início das emissões da TDT até que os particulares voltem a ter dinheiro para luxos, como seja comprar televisões novas ou descodificadores e antenas? Será que faz sentido uma campanha destas? Que pensará quem já não tem dinheiro para os medicamentos, para o peixe ou para a carne, da perspectiva de ter de ir comprar uma televisão ou um descodificador para poder continuar a ver os canais generalistas?    

SINAIS (26)

"Já Aguiar Branco e Miguel Relvas prestaram-se a entregar Dragões de Ouro. Em vez de marcar a dferença, o PSD mantém a promiscuidade com o futebol, para o qual a vassalagem dos políticos é um direito adquirido. (Relvas acumula, esta semana, com a nebulosa privatização de um canal da RTP, mantendo o outro em concorrência desleal com os privados)" - F.L., Visão 

quarta-feira, outubro 26, 2011

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (7)

A perspectiva britânica

COM GENTE DESTA HÁ COISAS QUE PREFERIA NÃO SABER

"O secretário de Estado José Cesário, apanhado na mesma situação, argumentou: "Ter casa aberta em Lisboa tem custos, que são elevados. A de Viseu suporto com o meu orçamento." O governante (ó espanto!) parecia mesmo querer que o Estado ajudasse à compra da casa na capital, pois argumentou que o tal subsídio servia para suportar, passo a citar, "os custos do empréstimo, mais a abertura da dita (IMI, condomínio, água, luz) e os custos de estar deslocado". E, claro, "estava na lei"." - Pedro Tadeu, Diário de Notícias

O argumento usado por José Cesário só deve encontrar paralelo naquele senhor que foi nomeado administrador dos CTT por Paulo Campos; que estava convencido que meia dúzia de cadeiras de um curso superior eram equivalentes a uma licenciatura e que por via disso passou a pôr no currículo que era licenciado. Quem usa argumentos destes para justificar o impensável revela que não pode exercer funções públicas e que é mais um dos que devia pagar para poder estar na política. Em vez disso pagamos-lhe nós a ele e ainda temos de ouvir as suas pérolas para pacóvios. Porca miséria.

terça-feira, outubro 25, 2011

DE LER E DE SE LHE TIRAR O CHAPÉU

"Nos últimos cinquenta anos funcionalizou-se o poder judicial. Em vez de o poder judicial assumir o seu papel de verdadeiro órgão de soberania, comporta-se como um grupo burocratizado de funcionários públicos"

"O Programa de Governo não trouxe novidades. (...) Em relação ao governo da justiça, nem o memorando de entendimento nem o Programa de Governo apresentam qualquer ideia de reforma estrutural. Consequentemente, como defende o presente livro, nada de profundo poderá mudar nos próximos anos. (...) Tal como a economia portuguesa, a justiça tem um problema conjuntural e um problema estrutural. Conjunturalmente está congestionada, com uma dilação processual excessiva, sem a celeridade adequada às necessidades económicas e sociais, mal organizada, gastadora, desastrosa, ineficaz. Estruturalmente, tem uma cultura jurídica e judiciária jacobina inconsistente com a modernidade do século XXI (defeito em que está "bem" acompanhada por outros ordenamentos em profunda crise como em Espanha, Itália e França)".

"As medidas impostas pela chamada troika pretendem apenas resolver ou suavizar os aspectos fundamentais processuais e de gestão dos tribunais que afectam directamente as grandes empresas e os escritórios de advogados. O projecto FMI limita-se a aplicar as medidas que já estavam previstas pelo anterior Governo e agora novamente consagradas como Programa de Governo em Junho de 2011".   


A Fundação Francisco Manuel dos Santos prossegue o notável trabalho que tem vindo a desenvolver em prol de uma cidadania decente, cultural e civilizacionalmente mais bem formada e participativa. Prova da forma superior como tem sido dirigida por António Barrreto é o conjunto de interessantes ensaios que de forma regular - coisa rara entre nós - e numa linguagem acessível ao bom pai de família, conhece os escaparates das livrarias e, ainda mais notável, as prateleiras de alguns supermercados.
O livro que agora conheceu a luz do dia, pela módica quantia de € 3,50, devia ser de leitura obrigatória nas faculdades de Direito, no CEJ, por todos os operadores judiciários, parlamentares e, em especial, pelos senhores ministros. Sei que a ministra da Justiça não deixará de fazê-lo, com a atenção devida, tanto mais que o ensaio é suficientemente curto, importante e profundo para ser lido e relido de fio a pavio.
O prof. Nuno Garoupa, numa linguagem acessível, de uma penada, percorre todo o nosso sistema de justiça, apontando os males e apresentando soluções. O ensaio foi escrito e ficou concluído ainda em 2010, mas tem um epílogo, como se terá percebido pela transcrição que acima fiz, que o situa hoje e o mantém actual (que sempre estaria sem necessidade desse epílogo).
O ensaio é de tal forma importante que eu me atreveria a dizer que qualquer reforma da justiça que se pretenda fazer em Portugal com cabeça, tronco e membros, só por temeridade, ignorância ou crónica má fé se poderá afastar no essencial daquilo que o autor escreve. Do mapa judiciário aos conselhos, com numerosos exemplos, fazendo apelo ao direito comparado mais recente, e passando por pontos tão nevrálgicos como o sindicalismo nas magistraturas, o recrutamento, ensino e formação de magistrados, e sem fugir à análise das questões inerentes à legitimidade democrática, está lá tudo.
Muitos não gostarão da forma como as suas corporações se vêem retratadas, mas se não formos capazes de manter a distância dificilmente compreenderemos o alcance, a profundidade e a importância deste trabalho. Para um catedrático, difícil não é escrever muito e denso. Isso, melhor ou pior, todos são capazes de fazer. Difícil é escrever pouco, de forma simples e clara, dizendo quase tudo o que importa, sem nada deixar pela rama.
Mais do que um imperativo conjuntural, a leitura do ensaio de Nuno Garoupa é um imperativo cívico, de que nem a falta de tempo ou o preço poderão servir de desculpa para que não seja lido. 

TILLMAN, THE BULLDOG

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (6)

A perspectiva francesa

SINAIS (25)

"As despesas com consumos intermédios e subsídios da Administração Central (ministérios e seus serviços, institutos públicos e Serviço Nacional de Saúde), as duas rubricas mais vezes associadas ao funcionamento do Estado, vão aumentar em 2012. Segundo o Relatório do OE, praticamente toda a poupança nos gastos da Administração Central é feita através de cortes que não tocam na "máquina". A redução da factura salarial é de 15%, as transferências sociais caem 11% e as despesas de capital (que incluem investimento e transferências para autarquias, regiões e empresas) "mingam" em 15%. Já o consumo intermédio sobe 1% e os subsídios à actividade económica "saltam" 15% face ao anterior" - Jornal de Negócios

segunda-feira, outubro 24, 2011

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (5)

A perspectiva norte-americana

SINAIS (24)

"Que temos, forçosamente, de mudar de vida, já todos o percebemos. A questão é como, em quê e em que prazo. E é aqui que o Governo de Passos Coelho dá mostras crescentes de ter perdido a lucidez. Quem tenha lido o livro que ele escreveu há cerca de ano e meio, percebe que ele não fazia ideia do que tinha pela frente se chegasse ao poder. Ali, na brilhante evidência da cartilha liberal que lhe impingiram, tudo era cristalinamente claro e fácil: destruía-se o 'monstro', castigava-se a indolência e a irresponsabilidade, premiava-se o mérito e deixava-se o mercado ditar a sua infalível lei, que, no final, tudo recolocaria em ordem.";

"O exemplo extremo desta ligeireza ideológica é a história da descida da TSU para as empresas, para estimular a sua competitividade. Se bem se lembram, foi a medida emblemática do programa eleitoral do PSD e o tema principal do decisivo debate televisivo entre Sócrates e Passos Coelho. Passos garantia que descia a TSU em 7 ou 8 pontos e financiava a descida através da subida de escalão de algumas taxas intermédias do IVA. Afinal, o que aconteceu é que a TSU desceu zero, mas, em contrapartida, subiu o IRC para as empresas, os trabalhadores vão ser forçados a trabalhar mais meia hora diária grátis e quase todas as taxas intermédias dos IVA subiram para o máximo! Digam-me lá quantos votos teria tido o PSD se tem anunciado isto na campanha? E sabem porque tudo mudou, a final? Porque, como confessou Vítor Gaspar esta semana, a descida da TSU era um modelo académico, estudado em algumas universidades, mas jamais testado na realidade, tamanhos são os riscos que acarreta...";

"Vendo todas as suas teorias a desabar no choque com a realidade, o Governo dá mostras de já ter perdido a lucidez e lançar mão de qualqeur coisa que, por milagre, faça a realidade coincidir com a sua verdade" - Miguel Sousa Tavares, Expresso

domingo, outubro 23, 2011

SINAIS (23)

"Os jovens sociais-democratas querem pedir à Procuradoria-geral da República que seja aberto um processo contra os anteriores governantes. Se querem folclore, acertaram; se querem fazer coisas sérias, era melhor aconselharem-se." - João Garcia, Expresso

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (4)

A perspectiva italiana

sábado, outubro 22, 2011

SINAIS (22)

"Esta semana, duas notícias aumentaram a irritação do CDS com 'o Álvaro': a proposta de reformulação do projecto do TGV e a ida do ministro a Viseu, a uma reunião do PSD, onde prometeu que a cidade terá autoestrada e comboio - factos que contrariam a promessa de deixar cair as grandes obras públicas, o que levou Helder Amaral, do CDS, a comentar que "as reuniões partidárias são pouco dadas ao bom senso" - F.S.C. com Â.S., Expresso 

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (3)

A perspectiva russa

SINAIS (21)

(fotografia de Amin Chaar, Global Imagens, no DN)

[O] "primeiro-ministro teve oportunidade de fazer um governo equilibrado e acabou por criar "dois ministérios, o da Agricultura e da Economia, que são praticamente ingovernáveis, nem que se ponha lá um super homem";

 "(...) por favor altere-se esta orgânica de governo, porque há particularmente dois ministérios que são praticamente ingeríveis";

"Depois da transformação que houve, a administração da Caixa Geral de Depósitos é do tamanho do conselho de ministros" - Rui Rio, economista, militante do PSD, presidente da Câmara Municipal do Porto, no Diário de Notícias.

sexta-feira, outubro 21, 2011

MORAL? ÉTICA? DE QUEM FALAVA O DR. BOTA EM QUARTEIRA?

Esta notícia diz quase tudo sobre o resultado de se ter, uma vez mais, entregado o poder a gente desta, que sempre abancou ao lado das manjedouras partidárias e institucionais para conseguir ter uma carreira, visibilidade e poder.
É tudo legal, pois é, mas será moral e eticamente aceitável? Algumas nomeações do governo anterior também eram legais mas nem por isso se tornaram aceitáveis. 
Tenho pena de ver amigos meus, gente que estimo e que se fartou de José Sócrates, e com razão, envolvidos com esta tropa que, à custa de muito sacríficio, o País vai conhecendo melhor em cada dia que passa.  

CÁ SE FAZEM, CÁ SE PAGAM

O artigo que Manuela Moura Guedes escreveu no Correio da Manhã
 é mais uma lição a provar que para alguns "os que nos servem hoje podem não servir amanhã". Passos Coelho, Miguel Relvas e os seus acólitos, que quiseram cavalgar a onda anti-socratista durante o conflito que levou ao seu afastamento da TVI, começam agora a pagar o preço da infeliz campanha que conduziram. Álvaro Santos Pereira já tinha desaparecido em combate. Para infelicidade deste País, que não consegue encontrar um rumo e gente à altura, não será o único. Passos Coelho e Miguel Relvas, com o beneplácito do Presidente da República que tão entusiasticamente ajudaram a reeleger e que tanto jeito lhes deu na hora de dissolver a Assembleia da República, não tarda seguirão o mesmo caminho. Como alguém disse, olhem, é a vida.

SINAIS (20)

"Os sacríficios pedidos aos portugueses não resolvem o problema" - João Salgueiro, ex-ministro das Finanças, economista e ex-presidente da SEDES, em entrevista ao Diário Económico 

A EUROPA SOB DIVERSOS ÂNGULOS (2)

A perspectiva alemã

A LER

"A eleição do dr. Cavaco Silva para Presidente da República foi uma das maiores desgraças que sucederam a Portugal e aos portugueses em 2006".

quarta-feira, outubro 19, 2011

DIÁRIO IRREGULAR

19 de Outubro

Mais do que as exigências de uma qualquer troika, o quotidiano esmaga-nos quando nos sentimos impotentes para mudar. Quando todo o esforço e energia se perdem nos meandros que muitas vezes nós próprios criamos.

Olhar para Portugal foi, em tempos, uma actividade serena e eminentemente contemplativa. Nos dias da ira que vivemos, constitui um drama em que revemos toda a nossa lassidão de décadas. Só chegámos aqui porque fomos capazes de nos desprezarmos e aceitámos que outros nos mutilassem a auto-estima. Admitimos trocá-la por um pouco de conforto efémero, pela ilusão da esperança e o convencimento da grandiosidade de um fado que há muito deixámos de merecer.

Não há a quem não custe ouvir o que principais actores desta tragédia dizem. Alguns, com o pudor suficiente para se manterem calados, devem pensar na ingratidão dos homens. Outros, mais atrevidos, compõem as contas do rosário que nos querem impor sob pena de excomunhão por parte dos senhores da troika. A apresentação do Orçamento de Estado para 2011 começou por ser anunciada como uma bênção. Depois tornou-se num castigo passageiro. Agora ameaça ser uma pena sumariamente imposta sem julgamento, defesa ou contraditório, uma canga à maneira china que a todos vergará.

Ninguém de bom senso e minimamente inteligente poderá continuar a escutar as intervenções dos ministros das Finanças e da Economia sem se interrogar se não estará na presença de zombies um saídos de uma fábrica de produção de tecnocratas em série. Gente que vivendo longe do mundo e sem um verdadeiro conhecimento não vestibular da vida, sob a capa de uma aparente humildade, são afinal a dramática reencarnação do Dr. Jekyll e de Mr. Hyde, em que ao discurso seminarista do primeiro se sucede a visão delirante e tenebrosa do segundo; em que ao apregoado e necessário esforço de ultrapassagem da crise em que todos estão empenhados se sucede a pulsão sarcástica e grotesca de um suicídio que pondo a nu todas as suas debilidades nunca chegará a sê-lo porque nem os meios para tal chegarão a tempo, ficando para ali a esvair-se, semi-morto, sujeito à dó e à piedade de terceiros.

Num notável texto publicado há alguns dias no Público, o historiador Rui Tavares definiu o momento que atravessamos como o de um novo PREC, mas agora a sigla identifica uma outra forma de loucura: processo de ruína em curso. Não andará longe da verdade.

Não tenho ilusões – nunca tive – nem sobre os erros do caminho que nos conduziu aqui nem sobre a forma desvairada, atroz e até certo ponto de má fé, como se procurou atalhar a males maiores. Não colocando em causa a necessidade do esforço colectivo, no qual também me revejo, pergunto se não é legítimo questionar a boa fé de uns quantos, se não será curial saber se os actores da tragédia terão consciência do papel que no final lhes está reservado.

No meio disto tudo, parece que o Presidente da República, depois de ter assistido serenamente à forma como nos últimos três meses se foram talhando as tábuas do nosso caixão, finalmente deu sinal de si. O homem, como todos sabem, pode ter os seus complexos, mas tem família e olha à sua volta, coisa que nem Vítor Gaspar nem Álvaro Santos Pereira conseguem fazem. Ou, se o fazem, o que duvido, não percebem ou não querem ver, hipótese para a qual me inclino atenta a unidimensionalidade de que o seu pensamento dá mostras.

O CDS percebeu-o e por isso o seu papel começa a ser ingrato. E vexatório. Paulo Portas, algures num avião, por formação e carácter, poderá estar convencido de que a nossa História nos obrigará a respirar. Esta é uma crença que a troika não possui. Eu também. E até o Presidente da República começa a duvidar. Percebe-se, em especial se levarmos em linha de conta que Francisco van Zeller se apresentou já como porta-voz de todos aqueles que querem aproveitar o tiro que o Governo de Passos Coelho disparou contra os reformados e funcionários públicos para cortarem generalizadamente regalias e subsídios no sector privado. O senhor só não justificou que razão pode ter tal raciocínio em relação a empresas saudáveis e pujantes, porque também as há e sempre haverá, onde a produção e os lucros continuam a ser elevados e em que tal medida só serviria para aumentar a contracção e empobrecer ainda mais os portugueses. Que há muitos patrões avaros a quererem aproveitar a boleia dos cortes não me impressiona. Impressiona-me sim o desplante com que há quem o proponha.

É natural que quando se antevê a morte do paciente pela terapia surjam algumas vozes apelando ao chumbo do orçamento por parte do PS. Tal posição poderia beneficiar da minha simpatia se o PS do Novo Ciclo já tivesse sido capaz de se livrar dos fantasmas do passado, de limpar os armários, de assumir com verticalidade os erros do passado. De enterrar condignamente os esqueletos que recebeu. Para utilizar uma linguagem actual, o PS não pode ficar refém do passado, da administração que foi destituída pelos accionistas da holding República Portuguesa na assembleia geral de 5 de Junho pp. Enquanto o PS não perceber isso jamais estará confortável na sua pele. E a escolha entre uma abstenção, um voto contra ou um voto a favor será sempre algo constrangedor e dramático para uma liderança que ainda agora começou a afirmar-se.

E não vale a pena iludir o presente e os problemas que este está a gerar para o futuro com os erros anteriores. Hoje lamento vivamente que o Presidente da República se tenha oposto à realização de uma auditoria às contas públicas à data em que foram marcadas eleições. Isso teria tornado tudo muito mais cristalino e evitar-se-ia que diariamente aqueles que irão ser julgados nas próximas eleições tentem encobrir a falta de soluções, a errância do discurso e das soluções que apresentam sobre as mais diversas matérias – TGV, TSU, impostos, IVA, corte nos subsídios, lembrança à última hora das subvenções dos políticos, aumento de meia hora no horário de trabalho, reforma autárquica a la carte, etc. -, para não lhe chamar incompetência, de que diariamente dão mostra nos mais variados fóruns, com os “buracos” que até agora não foram capazes de demonstrar preto no branco em que áreas ocorreram, quando se começaram a cavar, por culpa de quem e em que montantes exactos. E isto também interessa ao PS se este partido quiser libertar-se da clausura.

Permitir que se continue a atirar para cima do julgado, condenado e exterminado José Sócrates o peso da miopia, da ignorância, da ausência de soluções e da confusão de ideias dos actuais governantes, e, também, nalguns casos, da parolice bacoca dos novos Dr. Jekyll e Mr. Hyde, que tendo tido acesso ao laboratório anseiam ver o resultado das experiências que conduzem, não resolve nada. “Face ao que nos aconteceu, eu também penso que os responsáveis mereciam ir para a cadeia, mas não penso que seja possível mandá-los para lá. Seria um intolerável atropelo aos princípios do Estado de Direito. Fora do quadro da configuração dos ilícitos penais já estabelecida pela lei, a sanção das más políticas, mesmo das péssimas, só pode ser uma sanção política”, escreveu Vasco Graça Moura no DN.

Espero que o Orçamento de Estado não seja mais um monstro gerador de “monstrinhos”. Já bastam os que andam por aí, que falam, que dão conferências de imprensa e que tão cínica quanto alarvemente vão sorrindo de cada vez que pregam um prego no caixão.  

A CAMINHO DOS OITAVOS


BASILEIA - 0  
SPORT LISBOA E BENFICA - 2 

Voltaremos a ver-nos em 2 de Novembro.

terça-feira, outubro 18, 2011

UM LIVRO NOTÁVEL

"Talvez quem não conseguisse prever o seu próprio destino fosse por viver ofuscado com o frívolo da vida. A Matilde ponderava. Talvez só não acedesse ao conhecimento lúcido do destino quem passasse na vida como um charlatão, habituando o pensamento a uma superficialidade que falseava os instintos mais genuínos. Seria um modo de desbaratar, uma leviandade a transformar a fortuna de viver numa participação cínica ou anestesiada da criação. O homem do cerco sorria todo, também estava de cristandade feliz ao levar no carro o velho Gemúndio ainda pasmado e a Matilde muito decidida. Ele perguntava: ó dona Matilde, isto para si também é cá uma surpresa, muda-lhe a vida toda. E ela dizia: o que nos muda também nos aumenta. Queria dizer que obrigava a um crescimento interior e espevitava o engenho e a robustez para a sobrevivência". 

segunda-feira, outubro 17, 2011

A LER

Um texto notável do André Freire, meu antigo professor de sistemas eleitorais durante o mestrado, na edição de hoje do Público:

"Estas medidas, que em regra não constam do acordo, foram alegadamente ditadas pela má gestão das contas no primeiro semestre. Na verdade, representam um monumental embuste face ao que o PSD sempre defendeu no passado ano e meio. A justificação radica também num embuste: sabe-se que a derrapagem resulta, primeiro, de uma fraca captação fiscal, fruto da recessão; segundo, das consequências da irresponsabilidade fiscal reiterada na Madeira (e que o PSD voltou a cobrir ao não especificar o plano de ajustamento antes das eleições, e ao não definir quem pagaria a factura: sabemos agora que serão os servidores públicos do Continente e os pensionistas); terceiro, do ruinoso processo de privatização do BPN (um tenebroso caso de polícia conduzido por figuras gradas do cavaquismo) que o PSD conduziu recentemente: os privados compraram o BPN a preço de saldo, mas os contribuintes portugueses pagam primeiro (e mais uma vez) todas as dívidas".

Vale a pena ler o artigo todo e para isso bastará fazerem o respectivo clique na imagem. Para que depois não se misture tudo e não engane o povo dizendo que a culpa era do que saiu. 

sexta-feira, outubro 14, 2011

SINAIS (19)

"As "gorduras" enquanto matéria substantiva só existiam na cabeça do Passos Coelho candidato, não existem mais na cabeça do Passos Coelho primeiro-ministro" - Pedro Santos Guerreiro, Diário Económico.

UM FUNDO SUI GENERIS

A Lei n.º 53/2011, hoje publicada em Diário da República, contém o artigo 366º-A que foi aditado ao Código do Trabalho.

Este artigo, que tem por epígrafe "Compensação para novos contratos de trabalho", depois de nos números 1 e 2 esclarecer em que termos um trabalhador tem direito a compensação, prazo e modo de determinação, vem no número 3 referir que "a compensação é paga pelo empregador, com excepção da parte que caiba ao fundo de compensação do trabalho nos termos da legislação própria".

Portanto, cada um deveria pagar a sua parte. E digo-o no condicional porque o problema vem logo a seguir, no número 4, que estatui o seguinte: "no caso de o fundo de compensação do trabalho não pagar a totalidade da compensação a que esteja obrigado, o empregador responde pelo respectivo pagamento e fica sub-rogado nos direitos do trabalhador em relação àquele montante equivalente".

Espero que tenham percebido tão bem quanto eu, enquanto não começarem as sessões de esclarecimento que o "Álvaro" - ainda cá estará? - certamente já terá preparado.

quarta-feira, outubro 12, 2011

RESUMINDO E CONCLUINDO

"Saímos daqui com uma derrota que não nos serve para nada" - João Moutinho, em declarações à RTP após a derrota de ontem com a Dinamarca

domingo, outubro 09, 2011

SINAIS (18)

"A dúvida que começa a instalar-se é se o ministro conseguirá recuperar e dar conta do recado. Muitos temem que não e um ex-ministro do PSD antecipa o pior: "Este é um caso perdido. Já não recupera de maneira nenhuma". "Até janeiro, ou mostra que tem as ideias certas e a capacidade e a equipa para as executar ou é uma figura decorativa", diz um alto responsável do CDS. Outro dirigente centrista assume que o pensamento já está numa remodelação: "A questão é saber se Passos encara as remodelações com naturalidade e sem dramas, ou se será um obstinado como Sócrates em relação às escolhas que fez" - Ângela Silva e Filipe Santos Costa com R.P.L., Expresso

sábado, outubro 08, 2011

ALFISTA QUE SE PREZE...

... não poderá deixar de adquirir esta pequena e elucidativa obra de Alessandro Sannia, editada pela Tectum e que comemora os 100 anos da Alfa Romeo. Desde as origens com Darrracq e a Anonima Lombarda, passando pela história de Nicola Romeo, o período entre guerras e pós-guerra. Até ao renascer do mito. Enquanto esperamos o novo Giulia.

SINAIS (17)

"Quem tem um PowerPoint acha que tem tudo. Mas muitas vezes não tem nada. Foi isto que aconteceu ontem a Santos Pereira. Chegou ao parlamento com um PowerPoint com poucas novidades e que pura e simplesmente não respondia à pergunta que mais portugueses fazem e que os governantes repetem em surdina: e a economia? (...) A estratégia ideológica e política deste Governo assentava em poucos princípios: extremo rigor orçamental, redução do peso do Estado na economia, mudanças estruturais para tornar a nossa economia maisn competitiva. Os dois primeiros princípios são possíveis de atingir, embora com reflexos brutais imediatos. O último é mais difícil e não se atinge com Powerpoints nem novos estudos." - Ricardo Costa, Expresso.

quinta-feira, outubro 06, 2011

É PRECISO TOPETE

"Perdemos muitos anos na letargia do consumo fácil e na ilusão do despesismo público e privado. Acomodámo-nos em excesso. Agora, temos de aprender a viver de acordo com as nossas possibilidades e a tirar partido das nossas potencialidades." - Aníbal Cavaco Silva, Presidente da República, 5 de Outubro de 2011

Enquanto primeiro-ministro abriu caminho ao despesismo fácil, público e privado, ajudando a impulsionar uma economia assente numa política de subsídios, deixando que os fundos comunitários por falta de adequada fiscalização acabassem transformados em carros topo de gama e férias paradisíacas. Fechou os olhos quando o crédito ao consumo cresceu sem regras. Contribuiu para o desenvolvimento de universidades de vão de escada e a promoção de cursos caros e de duvidosa utilidade que encobriram múltiplas negociatas. Apadrinhou o aparecimento de uma cultura televisiva assente na promoção da imbecilidade e na frivolidade. Os negócios bolsistas especulativos transformaram-se no seu tempo numa actividade virtuosa, os offshore encontraram em Portugal um mercado fácil e lucrativo e gente que ganhou a sua confiança prosperou em negociatas que davam cadeia. Por tudo isso, ele, um acomodado do regime, seria o último a poder dizer o que disse num 5 de Outubro.

ELIMINE-SE O TERMO CORRUPÇÃO QUE ELA DESAPARECE

A forma como se promoveu a extinção da IGAL - Inspecção Geral da Administração Local - não abona em nada a imagem de seriedade, de transparência e de rigor que o Governo de Passo Coelho quer fazer passar. A carta de despedida do juiz Orlando Afonso, publicada no site do IGAL e que foi apressadamente mandada remover pelo ministro, pode ter algumas imprecisões ou não partir de uma visão correcta do seu signatário. Mas o que ele escreveu e a forma como foi silenciado obrigam-nos a reflectir sobre as verdadeiras intenções que estão por detrás da extinção do organismo.
Muito ficou por fazer, os meios talvez fossem escassos, o custo seria elevado, tudo isso podia estar certo, embora esteja convencido de que tudo o que se gastar na melhoria dos meios de combate à corrupção, por aquilo que esse combate nos pode dar a ganhar, será sempre pouco. Porém, é legítimo duvidar da existência de uma vontade séria de combate a corrupção quando à boleia das medidas da troika se promove a extinção dos organismos que estão na primeira linha desse combate e se silenciam as vozes discordantes.
A extinção do IGAL deixa a investigação da corrupção nas autarquias entregue aos jornais e às revistas. É muito mais fácil desmentir notícias e arregimentar jornalistas amigos do que contraditar factos devidamente investigados por uma equipa chefiada por um magistrado com provas dadas ou dar-lhe mais e melhores meios para combater esse cancro que destrói o Estado, a dignidade das pessoas e o cimento social.
A extinção do IGAL, não tanto por ter sido mais um organismo que desapareceu mas pelo que representa, foi mais uma derrota da legalidade, mais uma derrota do Estado de Direito, que serve para meter no mesmo saco, uma vez mais, autarcas sérios e tipos execráveis. Ela representa, ao mesmo tempo, uma vitória de todos aqueles que à direita e à esquerda se promoveram e que enriqueceram à custa do compadrio, da promiscuidade entre alguns autarcas, políticos e promotores imobiliários, tirando partido do clientelismo e da sordidez que por aí campeia para agilizarem alguns processos, fazendo loteamentos na fronteira da legalidade, quando não mesmo ilegais, alterando à socapa alvarás de loteamento, apropriando-se de bens públicos e manobrando autarcas e técnicos camarários menos escrupulosos em benefício dos seus interesses particulares.

quarta-feira, outubro 05, 2011

5 DE OUTUBRO

"O pensamento e a ciência são republicanos, porque o génio criador vive de liberdade e só a República pode ser verdadeiramente livre" - Antero de Quental 

terça-feira, outubro 04, 2011

OS MEUS HERÓIS TÊM NOME

(foto Autosport)

Já tinha vencido a famosa Corrida dos Campeões batendo campeões do mundo. No fim-de-semana que passou voltou a mostrar todo o seu valor ao arrancar um 2º lugar na corrida de Valência, prova a contar para o DTM, que é só o mais competitivo dos campeonatos de turismos. O Filipe Albuquerque provou uma vez mais que é um dos melhores. Com crise ou sem crise a sua classe reconhece-se à légua.

SINÓNIMOS

cura de silêncio: o mesmo que fuga, falta de transparência, logro, engano, desencanto, desconsolo, fiasco, quebra de promessas.

SINAIS (16)

"Pedro Serra e outros dois administradores do grupo, Justino Carlos e António Branco, informaram ontem a ministra de que pretendem renunciar à administração, quase um ano depois de terem terminado o mandato.

Desde Janeiro que a administração da AdP está em gestão corrente, o que dificulta a tomada de decisões sobre o futuro. O normal teria sido a eleição dos novos órgãos sociais em assembleia geral ou na tomada de posse do novo governo, mas até agora ainda não tinha havido uma decisão
." - Público, 04/10/11

O HABITUAL

Não sei de quem é a culpa pelo facto de terem sido contratados na Costa Rica médicos que fazendo falta estão encostados sem trabalhar. Como contribuinte é-me indiferente saber se a culpa é deste Governo que tomou posse quando as burocracias iam a meio ou se do anterior que os mandou vir. O que sei é que esta situação é inaceitável e que se há alguém que tem de resolver o problema é quem está em funções. Assim é que não pode continuar.

MAIS UM DE PEPETELA

Uma viagem por Angola. Mais uma aventura, desta vez tendo por pano de fundo os séculos XVI e XVII, durante o período da ocupação filipina. No estilo muito peculiar do vencedor do Prémio Camões 1997, mas lamentavelmente de acordo com a nova ortografia.

segunda-feira, outubro 03, 2011

UMA REFORMA NECESSÁRIA QUE COMEÇA MAL

Coincidindo com a apresentação do Documento Verde da Reforma da Administração Local, tive oportunidade de acompanhar na passada sexta-feira um debate promovido pela CIVIS - Associação para o Aprofundamento da Cidadania sobre "O papel das freguesias no século XXI".  Presumo que com a apresentação do documento produzido pelo gabinete do Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares este tipo de iniciativas se multiplicará por todo o País, uma vez que as soluções que serão encontradas terão consequências na vida das populações e no desenho do nosso futuro mapa autárquico. Por este motivo, importa alinhavar  algumas ideias sobre o assunto.

1 - Da leitura do Documento Verde percebe-se, em resumo, que se pretende consagrar "uma descentralização" e "racionalização das estruturas, apostando num modelo mais justo de fincanciamento, com maior proximidade, interacção, participação e eficiência", melhorando a prestação do serviço público, "aumentando a eficiência, pela redução de custos".

2 - Quanto à forma como esses objectivos serão atingidos, o documento esclarece que os diversos eixos de actuação têm um "tronco estrutural único que tem como objectivo a sustentabilidade financeira, a regulação do perímetro de actuação das autarquias e a mudança de paradigma da gestão autárquica".

3 - Os objectivos são, pois, ambiciosos - no que não há nisso nenhum mal, bem pelo contrário -, mas o documento é assaz palavroso e confuso, no que parece ser uma característica típica do ministro que o apresentou.

4 - Se desde há muito se afigurava como necessária uma reforma do mapa autárquico, logo verificamos que a reforma que agora se propõe pretende avançar mais rápida do que a própria sombra. As razões são conhecidas e no essencial reconduzem-se às exigências da troika e à mais do que evidente urgência de se fazer mais com menos dinheiro através de uma racionalização das estruturas e da introdução de ganhos de eficiência.

5 - Compreendendo os objectivos visados, confesso que não percebo como será possível mudar o "paradigma da gestão autárquica" centrando a reforma nas freguesias e deixando cada munícipio entregue à sua vontade. Uma "mudança de paradigma" - a expressão é horrorosa - implicaria não apenas uma mudança de mapa, mas igualmente a introdução de novos conceitos. Ora, o que se verifica é que se pretende fazer uma reforma continuando-se a raciocinar balizados pelos modelos herdados do liberalismo, esquecendo-se que as freguesias tal como as conhecemos hoje enquanto parte de um sistema de administração do Estado moderno são produto de uma época, estão datadas, e correspondem a uma concepção de vida e organização local que tendo tido origem na existência de núcleos populacionais agrupados em torno do campanário de uma igreja, em especial nas zonas rurais, só viria a consolidar-se com o Código Administrativo de Rodrigues Sampaio, em 1878. 

6 - Por outro lado, centra-se a reforma nas freguesias, ignorando-se que a nível europeu, e isso foi sublinhado por Freitas do Amaral, praticamente só nas zonas rurais de Inglaterra existem freguesias enquanto autarquias locais, sendo que em França o nível autárquico mais baixo é o do município. 

7 - Entendo, por isso mesmo, que, por uma vez, devíamos ser capazes de pensar uma reforma global, que encarasse a possibilidade de criação de novas estruturas e novas formas de organização do poder local, eventualmente pela criação de uma estrutura intermédia, mais adequada às necessidades do todo nacional, que permitindo os tais ganhos de eficiência mantivesse altos níveis de proximidade com as populações e não implicasse uma maior centralização, e por essa via menor democraticidade da decisão. Só por essa via seria possível diminuir o número de membros das assembleias municipais e de freguesia, "eliminando" muitos presidentes, quer de municípios quer de freguesias, e gerando verdadeiras sinergias. Só que para isso poder ser feito também seria necessário um outro espírito, uma outra abertura para analisar os problemas e encontrar soluções. 

8 - Sabe-se, igualmente, que reformas feitas sob pressão, seja por exigência interna ou imposição externa, como parece ser agora o caso, são normalmente reformas mal feitas, porque precipitadas e decididas sem um tempo de maturação suficiente, destinadas a cumprir calendários e a "mostrarem serviço" independentemente do maior ou menor acerto das escolhas. Tivemos décadas para reformar a administração local e nem mesmo um debate consequente se produziu. Penso que todos os momentos são bons para se fazerem as reformas de que o País carece mas bastará olhar para as últimas reformas que se quis fazer e para os resultados alcançados para se compreender que há uma grande diferença entre o que se fez na Segurança Social, por um lado, e o que se conseguiu em matéria de Justiça. Neste último caso, de há mais de uma década para cá, e com excepção do Direito Administrativo, não houve uma única reforma - Processo Civil, Fiscal, Urbanismo, Arrendamento, Direito Penal, Processo Penal, Sociedades, só para dar alguns exemplos mais frescos - que contribuisse para uma efectiva aproximação dos cidadãos ao Estado, que representassse uma efectiva melhoria do serviço prestado, que fosse sinal de uma maior estabilidade do tecido legislativo e em que os ganhos de eficiência e de imagem do sistema fossem indiscutíveis. Seria uma lástima fazer agora uma "reforma", cujo principal motivo é apenas de natureza económico-financeira, para dentro de meia dúzia de anos se chegar à conclusão de que as coisas foram precipitadas e que a reforma foi martelada para se conformar aos calendários da troika

9 - Havendo vários caminhos para se concretizar um objectivo - apesar do Governo ser nisto concordante mas não conseguir fazê-lo quando se trata de reduzir o défice público cortando a despesa da Administração Central - não se compreende que o único "avanço" passe pela fusão/aglutinação de freguesias deixando os municípios de fora.  Não se vê qual o paradigma que muda quando a extinção de municípios fica ao critério de cada um e todos sabem que não deve haver um único dos 308 municípios que esteja disposto a desaparecer ou a fundir-se com o vizinho. Todos eles encontrarão razões mais do que suficientes para continuarem como estão, a começar por todos aqueles de criação mais recente e que não estarão dispostos a ser consumidos nesta reforma.

10 - Pelo que a Faro diz respeito, uma das coisas que foi interessante saber reside no facto dos eleitos das assembleias de freguesias receberem por sessão cerca de 18 euros e os das assembleias municipais cerca de 70 euros. Seria bom, tendo presentes estes números, que todos conhecessemos os números que poderão resultar da reforma que o Documento Verde do ministro Miguel Relvas antecipa, quer em termos de poupança, quer em termos de aumento de encargos para os municípios/freguesias e para os fregueses/munícipes para se poder ter a noção exacta daquilo que se pretende ganhar ou que se poderá vir a perder no contexto dos muitos milhões que como contribuintes já todos suportamos e que, previsivelmente, ainda iremos suportar a mais logo que seja conhecido o próximo Orçamento de Estado para 2012.

11 - Se quanto às exigências relativamente às empresas municipais e parcerias em que as câmaras se envolveram parece haver concordância, tantos têm sido os desmandos conhecidos, seria também importante que as soluções agora avançadas levassem em linha de conta a articulação futura com as necessidades da regionalização - se é que esta ainda é um objectivo dos partidos políticos e não uma mera bandeira destinada a ser agitada de acordo com os calendários eleitorais e as conveniências do momento - e se desse já a conhecer o sentido das alterações constitucionais que se têm em vista para a concretização da reforma proposta.

12 - Qualquer reforma que se pretenda fazer tendo por critério fundamental  razões economicistas, esquecendo a razão da existência de comunidades locais, as suas necessidades e a melhor forma de corresponder a essas necessidades de acordo com padrões de rigor e transparência - por comparação com os municípios os casos de corrupção conhecidos, em razão da proximidade das freguesias, são muito menores do que naqueles - , e limitando a participação à análise sob pressão de um conjunto de desenhos feitos a régua e esquadro, será sempre uma reforma pífia. Sei que os tempos são outros, mas não queiramos reeeditar, em matéria autárquica e em pleno século XXI, o péssimo exemplo da Conferência de Berlim: os grandes ficaram satisfeitos, os pequenos tramaram-se e as populações ainda hoje pagam o preço de não se ter respeitado a lição da história. Não só não estamos no século XIX como Miguel Relvas ainda não se chama Bismarck.