quarta-feira, abril 01, 2009

O CUSTO DA DEMOCRACIA

João Cravinho, lá do seu exílio dourado nas margens do Tamisa, diz que a democracia portuguesa está doente. O mal já não é de ontem. A doença a que ele se refere e que a mina acompanhou de forma paulatina o desenvolvimento da democracia. Toda a transição democrática e a consolidação do regime conviveram de braço dado com o clientelismo, com a incúria, com o desleixo, com a esperteza, com o facilitismo, com o investimento subsidiado. A cunha obteve foros de excelência. Mas não só. Com esses "pequenos" males, vieram males maiores, veio a corrupção, o tráfico de influências e o branqueamento de capitais. Tudo medrando à sombra de hipotéticos êxitos e sucessos, de méritos que ninguém descortinava e que ano após ano as estatísticas desmentiam. Foi assim que muitos fizeram carreira, ascenderam a lugares de prestígio e alegremente enriqueceram. A democracia foi-se aviltando e com o aviltamento veio também o dos seus valores. Alguns, que pouco mais tinham que o ensino básico, tornaram-se dirigentes políticos, líderes partidários, homens de negócios, acabando por serem hoje reconhecidos, pasme-se, como "senadores do regime". Durante décadas o chico-espertismo foi sinal de sucesso. Não admira por isso mesmo que um ex-candidato presidencial, ministro de diversos governos e professor catedrático de Direito, continue a considerar que os offshores devem ser mantidos para dessa forma se ir apanhar os lobos no seu covil (Revista Visão 26/3/09). Tanto como até agora, visto que apenas se apanharam uns poucos e sacrificados cordeiros, alguns dos quais também se passseiam de Bentley, em Savile Row e na Quinta da Marinha, e nessas andanças já se devem ter cruzado com João Cravinho ou com o tal ex-candidato presidencial. Dizer que a democracia está doente em Portugal por causa da nomeação de alguém que foi pronunciado, julgado e condenado (ainda sem trânsito em julgado) como corrupto, denota um elevado sentido de humor. Não é a democracia portuguesa que está doente. É todo o regime. Mas em Londres, no meio do nevoeiro, não deve ser fácil distinguir estas "nuances".