quarta-feira, novembro 08, 2006

ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA


O dr. João Salgueiro, distinto economista, ex-governante, membro da Sedes e, entre outros cargos que exerce, actual presidente da Associação de Bancos, veio queixar-se, furiosamente, em nome da pandilha que dirige, da actuação do senhor ministro das Finanças e do primeiro-ministro. Diz que ele que o Governo está agir de modo populista e peronista, devido ao facto de querer obrigar os associados da associação que ele representa, a devolverem aos contribuintes a diferença entre aquilo que estes pagaram pelo cumprimento das obrigações contraídas junto dos bancos na aquisição de casa própria, devido ao sistema de arrendondamento das taxas de juro praticadas pela banca dos amigos do dr. Salgueiro, e aquilo que seria devido em termos contratuais.
O dr. Salgueiro está a esquecer-se de alguns pormenores que valerá a pena recordar-lhe antes de ele continuar desabridamente a espernear:
1. Os seus associados cobraram essas quantias aos contribuintes à margem da lei;
2. Os seus associados fizeram sempre os arredondamentos para cima, ou seja, em prejuízo dos contribuintes;
3. Os contribuintes lesados são, na grande maioria dos casos, pessoas pobres ou remediadas, que necessitaram de recorrer à banca para terem direito à satisfação de uma necessidade básica: o direito a terem uma habitação condigna para viver, o direito a terem um tecto para os abrigar.
4. Para muitos dos contribuintes lesados, o pagamento dos juros e o reembolso dos empréstimos constitui um sacríficio grande no seu dia-a-dia para cuja satisfação, muitas vezes, cortam na comida e noutras necessidades básicas.
5. Se os contribuintes fossem ricos, como os associados da associação do dr. Salgueiro, como os banqueiros que dirigem os seus associados e os membros dos respectivos conselhos de administração, eles não precisariam dos bancos da associação do dr. Salgueiro para nada.
6. Os associados do dr. Salgueiro ao fazerem os arredondamentos para cima actuaram de forma necessariamente dolosa, já que sabiam que ao fazê-lo estavam a prejudicar os seus clientes e a enriquecer à custa deles, aumentando os respectivos lucros no final do ano.
7. Os contribuintes lesados são na maior parte dos casos pessoas ignorantes em matéria de banca, que se sujeitam às imposições leoninas destes e à publicidade enganosa que muitos fazem.
8. Os associados do dr. Salgueiro contaram, uma vez mais, ao agirem da forma por que agiram, com a complacência do Banco de Portugal e dos seus órgãos de fiscalização que, aliás, são os principais responsáveis pela situação que hoje se vive.
9. O Governo legítimo de Portugal está apenas a tentar corrigir práticas ilegais e injustas e a tentar equilibrar a relação entre a banca e os seus clientes indefesos.
Posto isto, a única coisa que o senhor dr. Salgueiro devia ter era contenção na língua e vergonha. Mas neste país de brandos costumes, cuja banca perdeu há muito o decoro e o respeito pelos seus clientes, é natural que o presidente da associação de bancos faça declarações do teor das que proferiu e prefira que os seus associados se continuem a comportar como agiotas fariseus do que como a gente respeitável cuja imagem pretendem seraficamente fazer passar.
Além do mais, o senhor dr. Salgueiro sabe perfeitamente, já que a ignorância da lei também não lhe aproveita nem aos associados da sua agremiação, que à falta de outra razão, o dinheiro dos contribuintes sempre deverá ser restituído à luz das regras do enriquecimento sem causa.
Procurar afirmar o contrário e multiplicar-se em intervenções destemperadas só vem dar razão a quem sempre desconfiou dos agiotas. O facto de um negócio ser legal, embora pouco fiscalizado, não lhe confere imunidade de actuação. E muito menos o direito de actuar junto dos clientes à maneira dos gangsters, esportulando a milhares de contribuintes pobres e remediados aquilo que por direito lhes pertence e nunca lhes devia ter sido subtraído.
Se eu fosse ao senhor ministro das Finanças, cuja actuação tem sido exemplar - é para isso que lhe pagam -, eu obrigava os associados do senhor dr. Salgueiro a devolverem com juros tudo o que esportularam nos últimos anos. Isso é que seria justo. É para haver mais justiça e para cumprir a Constituição da República que os eleitores ainda votam e escolhem quem os governe. Não é para vergonhosamente alimentarem um bando de fariseus e de agiotas sem escrúpulos.
P.S. E, já agora, que pensa disto o senhor Mendes? Sim, o tal que anda a carpir mágoas pela Madeira do senhor Alberto João e diz que é o líder da oposição.

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