domingo, dezembro 14, 2008

A CASA DOS ESCRITORES E POETAS

Ouvi esta manhã António Costa na TSF, mas como não pude ouvir tudo, li com a devida atenção a entrevista que o Diário de Notícias publicou. Registei, com agrado, a evolução da situação do Parque Mayer, a forma frontal e decidida como ele abordou a questão das dívidas da Câmara e dos problemas com o Tribunal de Contas, os herdados e os actuais, mas em especial retive as suas declarações relativas às casas de escritores. Lisboa tem neste momento, pelo menos que eu saiba, a Casa Fernando Pessoa, e irá ter muito brevemente a funcionar, na Casa dos Bicos, concretizada que está a oferta e a aceitação, a Fundação José Saramago. Fiquei agora a saber que também estarão em curso negociações com a família do escritor Lobo Antunes para a abertura de uma outra casa ou espaço destinado a divulgar e perpetuar a sua obra. Acho muito bem que todos os escritores tenham, ou queiram ter, uma fundação, uma casa ou um estaminé qualquer para honrar a sua obra e o seu nome e tornar mais conhecidas as nossas letras. Mas começa-me a parecer excessiva, e assaz provinciana, esta perspectiva de proliferação de espaços avulsos dedicados a escritores. Sabendo das divergências idiotas entre Saramago e Lobo Antunes, dir-se-ia que cada um quer um espaço à medida do seu umbigo. Os vivos, é claro, porque quanto aos mortos, como aconteceu com o Pessoa, ninguém lhes perguntou se queriam uma casa, nem mesmo quando eram vivos e lhes fazia falta. Porventura, ele, Fernando Pessoa, que como tantos outros foi ignorado e ostracizado quando merecia ser conhecido, até estranharia tal coisa. Por isso mesmo pergunto se não seria mais acertado, menos pesado de um ponto de vista económico-financeiro, e mais sensato, pensar na criação de raiz de um espaço na cidade de Lisboa, com dimensão e visibilidade, destinado aos nossos escritores e poetas onde coubessem todos, do Pessoa ao Lobo Antunes, do Saramago ao José Cardoso Pires, passando pelo O'Neill, pelo Virgílio Ferreira, pelo Sena e pelo próprio Orlando da Costa, para só citar alguns que me vêm agora à cabeça? Por que não fazer uma coisa parecida com o Writers Museum de Dublin, que atraisse público, onde se organizassem, conferências, ciclos de cinema, exposições, em vez de se estar a pensar fazer casinhas pelas esquinas que dificilmente sobreviverão sem grandes injecções de capital e que nunca terão sozinhas dimensão por falta de público suficiente? Bem sei que em Dublin também existe um James Joyce Centre, mas nós, não só não temos o número de leitores e a tradição literária que eles têm, como também não temos um número semelhante de prémios Nobel e de escritores e poetas que tenham atingido um estatuto mundial de reconhecimento (mesmo sem o Nobel). Espero que o António pense nisto antes de se pôr a "oferecer" casas às famílias dos escritores. Neste país pensa-se pouco, pequenino e sem horizonte. É tempo de acabar com isso.