quarta-feira, novembro 28, 2007

É PRECISO TER TOPETE...


... para ver bloguistas militantes, que aos costumes sempre dizem nada, a opinarem sobre as eleições para a Ordem dos Advogados. A Ordem é uma muito respeitável e vetusta agremiação que vai a votos no dia 30 de Novembro e que devia ser merecedora de mais respeito do que aquele que tem merecido. Pese embora o facto de nos últimos anos ter levado tratos de polé - a começar pela revisão de alguns dos artigos do próprio Estatuto que aligeiraram deveres e legalizaram práticas reprováveis - por parte de muitos daqueles daqueles que deviam ter sido os primeiros a garantir elevação, ponderação e discrição na intervenção e no discurso, é bom que os advogados não se coloquem à margem do acto eleitoral. Não sei quem vai ser o novo bastonário, nem se ele se irá empenhar na dignificação da advocacia portuguesa, combatendo os excessos de protagonismo e de visibilidade mediática de alguns dos seus membros, reomendando-lhes contenção e elevando o discurso a um patamar mais consentâneo com as tradições, a honra e a dignidade da advocacia portuguesa. É tempo de elevar os padrões de exigência e rigor da advocacia, tão mal tratados que foram nos tempos mais recentes, impor o escrupuloso respeito pelas regras deontológicas, quantas vezes esquecidas e ignoradas de acordo com as conveniências do momento, para que de outras fossem aplicadas sem qualquer critério ou bom senso. Espero, pelo menos, que não haja chapelada nem defenestrações, que seja possível voltar a abrir as janelas e deixar sair o bafiento corporativismo que empesta o ar. Quero, ainda, que aquele que vencer, seja capaz de proteger a advocacia em prática solitária, e imponha limites ao crescimento das sociedades de advogados e à proletarização ignorante da advocacia. Que independência pode ter um advogado numa sociedade que lhe impõe o cumprimento de patamares mínimos de facturação e o obriga a fazer lançamentos diários em complicados programas informáticos, como se ele fosse um qualquer amanuense? Bem sei que há quem usando o título seja sócio, gerente e administrador de sociedades comerciais, e que a maior parte evite olhar para algumas tabuletas que por aí há do tipo "Consultadoria Fiscal e Financeira" ou "Domiciliação de sociedades", enterrando a cabeça na areia, mas a Ordem não pode continuar a conviver alegremente com este estado de coisas. Sociedade que se preze tem de ter uma advocacia forte, insubmissa aos ditames do mercado, às clientelas empresariais, ao ferrete do Estado ou dos partidos políticos e capaz de rejeitar o promíscuo convívio com algumas autarquias. Uma advocacia forte tem de ser capaz de recusar liminarmente o cambão e todas as formas encapotadas de exercício da advocacia, a começar por aquelas que são hoje praticadas por alguns membros da classe notarial, muitas das quais ao abrigo de protocolos de legalidade mais do que duvidosa celebrados com bancos e mediadoras imobiliárias, que apenas serviram para transformar antigos servidores do Estado em serventuários, mais bem pagos é certo, de empresas comerciais. Que os notários privados se tenham querido converter em moços de fretes dos bancos e das mediadoras imobiliárias a troco de meia dúzia de euros é lá com eles. Que a Ordem conviva alegremente com isso e continue a fechar os olhos ao exercício descarado de procuradoria ilícita é que me parece mal. Posto isto, gostava que os candidatos a bastonário se pronunciassem, por exemplo sobre as questões que aqui refiro e que até hoje não vi ninguém abordar, a não ser em tese generalíssima, ainda antes do acto eleitoral de sexta-feira. Certamente que isso ajudaria a esclarecer muita coisa, a separar águas e a mobilizar indecisos e abstencionistas, pese embora a obrigatoriedade do voto consagrada nos estatutos. Mas como duvido que o apelo vá a tempo, ao menos aqui fica o recado. Perante um Estado cada vez mais prepotente e abusador, perante tribunais ineficientes, caros e morosos, a única garantia do cidadão reside na capacidade de intervenção da advocacia, na seriedade e honradez dos homens que lhe dão corpo e rosto aos que anonimamente cumprem o seu múnus. O último baluarte da liberdade, mais ainda em democracia, reside na Ordem dos Advogados, na sua capacidade de mobilização e na decência das escolhas que os seus membros, e não outros por eles, sejam capazes de fazer. Haja tino.

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