sexta-feira, julho 20, 2007

À ATENÇÃO DOS PODERES PÚBLICOS


Local: Tribunal Judicial da Comarca de Faro
1º Juízo Criminal
Data: 20/7/07
Hora: 15h
Diligência agendada: Leitura de sentença

Despacho do Mmº Juiz:


"Ao pretender elaborar sentença do presente processo senti necessidade de ouvir as cassettes para tentar esclarecer determinados pontos das notas manuscritas por nós tomadas no decorrer das várias sessões da audiência de julgamento. Todavia, ao fazê-lo, constatei que as declarações do arguido, da demandante civil e de grande parte das testemunhas não ficaram gravadas, por deficiência técnica não suprível. Com efeito, mesmo colocando as cassettes numa aparelhagem de alta fidelidade, as mesmas permanecem inaudíveis. Assim sendo, não foi possível esclarecer as dúvidas (...) essenciais à matéria de facto. A falta de registo da prova (...), constitui irregularidade que pode ser conhecida oficiosamente (artigo 123º do Código de Processo Penal). A sanação de tal irregularidade implica, no caso, a repetição da prova oralmente prestada, o que se determina" (transcrito na hora).


Em conclusão: Depois de 4 sessões de julgamento, depois de ouvidas 27 testemunhas, oriundas dos mais diversos locais, entre as quais se contavam diversos médicos e vários funcionários públicos, que deixaram de dar consultas e de trabalhar nos seus locais próprios para colaborarem com o sistema judicial, o julgamento vai ser repetido lá mais para o final do ano. Trabalho inglório, esforço vão. Dir-se-ia que os nossos magistrados estão todos muito folgados. É tempo de situações destas não continuarem a acontecer diariamente nos tribunais desta paróquia. Um colega comentava a esse respeito que isto é o terceiro mundo. Eu creio que não. No terceiro mundo não há sistemas de gravação de audiência, mas os julgamentos fazem-se. Aqui fazem-se mas é como se não se fizessem. Já imaginaram qual a diferença entre andar a pé ou andar numa bicicleta sem pedais? A pé, devagar ou depressa, chega-se ao destino. Com uma bicicleta sem pedais não se sai do mesmo sítio. Será esta a nossa sina? Felizmente, esta situação originou a aquisição de uma nova aparelhagem para gravação de audiências. O sistema anterior era, ao que nos foi confidenciado, o refugo de um tribunal de Lisboa. Acredito que sim, mas refugo ou não, será que isto não era evitável? O barato continua a sair-nos muito caro e eu, que abomino regionalismos, confesso que só nestas alturas é que sou a favor da regionalização. Curiosamente há regionalistas que ignoram estes problemas. Porquê? Não dão visibilidade, protagonismo, em suma, benesses. Por isso mesmo, penso eu, é que ninguém os ouve sobre estas questões, pese embora as suas responsabilidades. Em Portugal é mais fácil ser político do que cidadão.

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