10 de Abril de 2011 “A sobrecarga do sistema político e dos seus actores por uma penosa administração das trivialidades põe de manifesto a carência dessa capacidade de estabelecer prioridades e discutir a partir de perspectivas amplas sobre o que há a esperar da política. Pois toda a gente sabe que essa sobrecarga culposa não é mais que uma estratégia de fuga à complexidade.” – Daniel Innerarity, A Transformação da Política
Volto ao meu espaço. Um espaço de interioridade partilhado publicamente. A voragem dos dias e da febre mediática não se compadece com o recolhimento da reflexão, com a secura da introspecção. Ademais necessária se queremos mantermo-nos sãos.
Setenta e duas horas depois dos primeiros discursos cumpre perguntar para que serve um congresso? O corrupio de “personalidades”, de “camaradas”, de “militantes” que se deslocou a Matosinhos converge num único ponto: a culpa da crise vem de fora e agravou-se com a atitude da oposição irresponsável que temos.
Um partido feito de meias-verdades, de chavões, de unanimismos e de aplausos nunca será capaz de olhar para si, de se confrontar com a realidade e de modernizar. A um dinossáurio de proveta idade sucedem dinossáurios jovens e prematuramente ancilosados.
Lutar dentro dos partidos é hoje uma quimera. Tudo aquilo é deprimente. Começa no facto de se votarem moções de orientação política desfasadas no tempo, ultrapassadas pelos acontecimentos, quando o que seria aconselhável, depois do que sucedeu, seria suspender o conclave por quinze dias, iniciar um novo período de apresentação de propostas e de formalização de candidaturas. Mas nada disso interessa. Tudo o que seja discutir ideias para o futuro, estratégias de renovação e alargamento da participação é incómodo. O tecido social do partido é cada vez mais formado por caciques locais, delegados de informação médica que viraram autarcas, empresários da construção civil, analfabetos, guindados a administradores hospitalares e dirigentes locais pelos quais passa toda a estratégia, devidamente secundados pelas clientelas habituais. Ana Gomes vai continuar a pregar aos peixinhos. E Almeida Santos continuará a ser o farol do socratismo. Não tem, pois, com que se indignar quando vê os delegados ao congresso saudarem os convidados que ele apresenta com uma vaia. Esta gente que vaia os convidados foi eleita para lá estar. E antes foi formatada por aqueles que de congresso para congresso consideram que ele, Almeida Santos, é a pessoa mais indicada para dirigir os trabalhos. E que não acha mal que não se respeitem horários, que os dirigentes vão jantar e já não apareçam para a continuação dos trabalhos, que o secretário-geral vote depois da hora normal de fecho das urnas e que se remetam as vozes mais críticas para o momento em que a sala está vazia. Nada disso fará confusão aos delegados. A alguns, é claro, aos que enviam cartas para as embaixadas a oferecer os seus préstimos quando a hora aperta, e “conhecimentos”. Não, não me refiro aos académicos, que esses não os têm, mas sim aos outros, aos que movem montanhas em Lisboa e garantem sucatas e sinecuras no país esquecido das SCUT.
No estado em que os partidos estão só há uma certeza: atrás de um Sócrates virá outro, atrás de um coelho virá uma lebre. Norberto Bobbio sabia do que falava: “O custo a pagar pelo empenhamento de poucos é muitas vezes a indiferença de muitos. Ao activismo dos líderes históricos ou não históricos pode corresponder o conformismo das massas”. E o mesmo Bobbio citando Rousseau: “Assim que o serviço público deixa de ser a principal ocupação dos cidadãos e estes começam a preferir servir com a sua bolsa em vez de com a sua pessoa, o Estado encontra-se já próximo da ruína”.
Enfim, há quem pense que isto vai dar a volta, que temos oposição. Não temos. O PSD actual, o do senhor Passos Coelho, não passa da representação teatral de uma realidade vivida. Chain Perelman falou disso na sua dissociação das noções, na contraposição entre a realidade e a aparência. Querem melhor exemplo do que a escolha de Fernando Nobre para cabeça de lista por Lisboa? Não sei se Passos Coelho se aconselhou com Dias Ferreira, o ex-candidato a presidente do Sporting, mas quer-me parecer que Nobre vai ser o Paulo Futre de Passos Coelho. E se não houver um departamento para o chinês há-de haver um para o rei da poncha. Pela freguesia que Jardim teve no congresso do PSD/Madeira, é natural que dentro de dois meses não haja copos que cheguem para todos. Por agora o tom é “criminoso”. Imaginem como será no final de Maio, quando o calor apertar e se chegar à conclusão de que a poncha já não dará para todos. Nem os euros.