segunda-feira, novembro 15, 2010

ÁS DE TRUNFO

"Os conceitos de moral mudam conforme as circunstâncias e se, em teoria, reconhecemos serem as cunhas lesivas da justa justiça, quando sacodem para o lado um pedido nosso dói como um pontapé por baixo. Rodolfo Lucas, o fura-vidas que se abrasileirou levando com ele Eva Teresa, a fogosa Rosália e sua senhora, dona Clotilde, dizia, a respeito: para os amigos não há favores, só a obrigação de puxarmos por eles quanto pudermos. Nessas alturas, eu retorquia, enfatuado, que tráfico de influências, nome fino e grave, era sinal maior da atávica pedinchice portuguesa. Tivesse imaginado os acontecimentos posteriores e, decerto, acrescentaria que há excepções, família é família".

Graças a mais uma excelente iniciativa do Pátio das Letras e da sua activa dinamizadora, que me confidenciou ter o nosso António Manuel Venda passado por ali há relativamente pouco tempo, tive o privilégio de ouvir e trocar algumas palavras com Mário Zambujal, no sábado passado, por ocasião da apresentação do seu mais recente romance.

Mantendo a bonomia e simpatia de sempre, o autor lá foi discorrendo com os seus leitores, contando histórias curiosas, e deliciosas, do seu percurso de vida. O Mário Zambujal continua a ter um estilo muito próprio de comunicar, ao mesmo tempo discreto e perspicaz, pontuado pelo humor de quem sabe que o melhor desta vida são as pessoas.

E se é certo que no diálogo travado foi possível ficar a saber da relação distante que ele mantém com as máquinas, muito em particular com os computadores, não foi todavia conseguido que nos desvendasse quem era a dama de espadas.

Não foi grave. Nem o será enquanto pudermos contar com a escrita do Mário Zambujal e o conforto que a sua presença sempre transmite. Um verdadeiro ás de trunfo de uma geração do jornalismo que marcou a literatura portuguesa contemporânea e que vai continuar a marcar, a avaliar por mais este livro que agora nos trouxe.