Não sei porquê, mas sempre que saio do país acontece alguma coisa. Neste país onde nada acontece. De repente parece que um turbilhão tomou conta deste pequeno rectângulo. José Sócrates fez uma micro-remodelação, ignorando os reparos internos e externos. Ainda não passaram duas semanas e os resultados começam já a aparecer. Na área da Justiça, onde inexplicavelmente ficou tudo como dantes, um subordinado do ministro da Justiça, ignorando a sua condição de director de um órgão de polícia crimininal e de responsável pela condução no terreno de algumas importantíssimas investigações, resolveu, de uma forma que teve tanto de ingénua quanto de irresponsável, vir criticar o facto da sua própria polícia ter promovido a constituição de arguidos num processo cujo inquérito continua em curso e cujas repercussões internacionais colocariam em xeque todo o sistema de investigação criminal e a crediblidade da Justiça portuguesa. Alípio Ribeiro lá saberá porque o disse e da forma como o fez com o ar mais cândido deste mundo num programa de televisão. Alguém lhe deveria ter dito que aquilo não era um concurso e que ali não se davam prémios, falha que até seria colmatável. O que já é de todo incompreensível é que continue à frente da PJ depois do que disse e que o ministro da Justiça se tenha limitado a referir que o facto daquele se manter no lugar dizia tudo sobre o que ele pensava sobre o assunto. Creio que não é verdade. Se bem conheço o ministro da Justiça, este não terá ficado satisfeito com o que ouviu, mas se entendeu não fazer nada ou, pelo menos, deixar transparecer que nada fez, por pensar que estava a proteger a PJ e as instituições do nosso sistema de justiça, fez mal. A solidariedade funcional e pessoal fica-lhe bem. É isso que se espera de gente de bem. Só que o interesse das instituições e a defesa do bom nome do país têm de ter prioridade. As declarações do senhor Director da PJ foram um perfeito disparate susceptível de colocar toda a estratégia - vamos admitir que havia uma - de investigação e condução de inquérito do "Caso Maddie", ao nível do que se passa no Ruanda ou na Birmânia. Depois do afastamento de Gonçalo Cabral não valia a pena dizer mais nada. Era chegar ao fim do inquérito e então esclarecer o que houvesse a esclarecer. Infelizmente a coisa não ficou por aqui. E logo a seguir, numa posição tão inaceitável quanto o conteúdo das declarações ou a posição de Alberto Costa, vieram as declarações de um ex-Bastonário da Ordem dos Advogados. Mas quanto a este quer-me parecer que palavras como decoro e sensatez há muito que fugiram do seu vocabulário. As palavras são volúveis, todos o sabemos. Aconteceu com ele como aconteceu com outros colegas seus e com representantes de algumas ordens ou associações profissionais e sindicais. O rei vai nu. É, pois, natural que todos falem. Aos poucos começa a tornar-se incontornável a transmutação da velha imagem da Justiça, que de uma bela mulher de olhos vendados com uma espada numa mão e a balança na outra, se tenha tornado num sujeito baixote, obeso, suado, vestido com uma tanga minúscula, levando um computador portátil numa mão e um megafone na outra. As boas novas têm de continuar a ser anunciadas.
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