O debate da moção de censura contra o Governo, apresentada pelo Bloco de Esquerda e a propósito da negação do referendo ao Tratado de Lisboa, revelou que atingimos o grau zero da política nacional. A indigência argumentativa foi o que mais marcou a sessão de hoje. Dizer que devíamos estar muito satisfeitos por termos um tratado com nome de Lisboa como mais uma razão para evitar o referendo, ou dizer que o novo tratado - uma verdadeira manta de retalhos, confusa e ininteligível para qualquer cidadão normal - é uma coisa completamente diferente da Constituição Europeia preparada por Giscard d'Estaing, são tão maus argumentos como dizer que a apresentação da moção se justifica por o Governo estar a "abafar o país", que a não realização do referendo seria uma "conspiração contra a Europa" ou que era em nome da Europa que o BE iria votar. Este último, conhecendo-se as suas posições, denota mesmo alguma falta de seriedade, coisa a que também nos vamos habituando quando se trata de política nacional mas com a qual não nos conformamos. O panorama é, pois, desolador, atinge todas bancadas por igual e a ele também não escapa o sistema de voto electrónico da Assembleia da República. A hilariante cena da votação, com um deputado do CDS a chamar a atenção do presidente do parlamento para a troca de votos com o PCP, o sistemático mau funcionamento do quadro e os risos provocados nas bancadas não deixam de ser um sinal do estado de degradação a que as coisas chegaram lá para os lados de S. Bento. Os risos e gargalhadas dos senhores deputados em razão de mais uma falha tecnológica são o espelho da triste imagem que deixaram depois de tão pobre debate. A não ser que se estivessem a rir de si próprios. Mas se era isso, ainda que tal atitude pudesse demonstrar um resto de clarividência, não me parece que seja grande contributo para reaproximar a política dos cidadãos. De qualquer forma, só eles poderão dizer de que se riam. Jaime Gama merecia dirigir uma assembleia de outro calibre.
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