sexta-feira, fevereiro 09, 2007

ATALHAR ENQUANTO É TEMPO



Vinha há pouco de Lagos quando ouvi no rádio do carro as declarações feitas pelo Dr. Souto Moura, ex-Procurador Geral da República, sobre as disquetes do “Envelope 9”. Não me custa nada acreditar que o Dr. Souto Moura fala verdade. Além de não ter quaisquer razões para duvidar da sua seriedade é uma pessoa de quem tenho ouvido as melhores referências, quer do ponto vista profissional, quer humano.

Outra coisa é ver reafirmada a ingenuidade da personagem e uma certa displicência na forma como exerceu o cargo e impôs a disciplina entre as suas tropas. Ao admitir da forma por que o fez que as disquetes do “Envelope 9” não foram sequer abertas pelos investigadores e que pura e simplesmente ficaram esquecidas até serem descobertas pelos jornalistas no processo Casa Pia, Souto Moura passou um atestado de irresponsabilidade e incompetência aos seus antigos subordinados.

Porque das duas uma: ou as disquetes não serviam para nada e foram requisitadas apenas para descargo de consciência dos investigadores, ou se eram necessárias à investigação, então torna-se perfeitamente incompreensível que tenham ficado esquecidas até que a bomba rebentasse. Isto diz bem da forma como muitas investigações foram conduzidas por esse país fora e explica porque é que, por exemplo, num processo como o da GNR de Albufeira, houve quem tivesse chegado a ser acusado pelo Ministério Público de ter fundado e pertencer a uma associação criminosa quando tinha cerca de 5 anos de idade. Desatenção dirão alguns, falta de profissionalismo dirão outros.

Eu já tinha a ideia, amplamente confirmada na minha vida de todos os dias por esses tribunais, de que o Ministério Público andava em “roda livre” e que cada magistrado fazia o que queria, como queria e quando queria sem o mínimo controlo por parte da hierarquia. Controlo só havia quando surgia algum problema e muitas vezes esse controlo remetia-se a um mero “concordo” ou “visto” sem consequências.

Agora ficámos todos com a certeza de que Pinto Monteiro tem mesmo uma tarefa hercúlea pela frente. Eliminar tiques ganhos ao longo de décadas, agilizar as investigações, conferir-lhes rigor e seriedade, impor a cadeia hierárquica por via da intervenção e não do temor, coordenar de forma efectiva os magistrados e responsabilizar quem tem e deve ser responsabilizado na sua actividade diária. A dignificação da função e o respeito pelo Estado de Direito passam necessariamente por aqui.

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